Na manhã desta quinta-feira, o Papa Francisco visitou a sede da FAO onde decorre a II Conferência Internacional sobre a nutrição, sob o tema “Nutrição melhor, vida melhor”. No seu discurso o Papa se alegrou com a decisão de reunir nesta Conferência representantes de Estados, instituições internacionais, organizações da sociedade civil, do mundo da agricultura e do setor privado, para estudar juntos as formas de intervenção para garantir a nutrição e as mudanças necessárias que devem ser acrescentadas às estratégias atuais. A unidade de propósitos e de obras mas, sobretudo, o espírito de fraternidade, podem ser decisivos para soluções adequadas e a Igreja sempre procura estar atenta e solícita ao bem-estar espiritual e material das pessoas, e de modo particular as marginalizadas e excluídas, para que a sua segurança e dignidade sejam garantidas.
O Papa constatou em seguida que os destinos de cada nação estão hoje mais do que nunca entrelaçados entre si, como membros de uma mesma família que dependem uns dos outros, mas estas relações estão demasiadas vezes danificadas pela suspeita recíproca, que por vezes se converte em formas de agressão bélica e econômica, minando a amizade entre irmãos e rechaçando ou descartando quem já está excluído. Mas o direito à alimentação só será garantido se nos preocuparmos todos com o sujeito real, ou seja, com a pessoa que sofre os efeitos da fome e da desnutrição, disse o Papa que também denunciou uma realidade frequente nos nossos dias em que se fala tanto em direitos, esquecendo com frequência os deveres e nos preocupamos pouco com os que passam fome.
A luta contra a fome e a desnutrição é dificultada pela «prioridade do mercado» e pela «preeminência da ganância», que reduziram os alimentos a uma mercadoria qualquer, sujeita à especulação, inclusive financeira. E enquanto se fala de novos direitos, o faminto está aí, na esquina da rua, e pede um documento de identidade, ser considerado em sua condição, receber uma alimentação de base saudável. Pede-nos dignidade, não esmola – reiterou o Papa Francisco. Estes critérios – prosseguiu o Papa - não podem permanecer na simples teoria: pessoas e povos exigem que a justiça seja colocada em prática; não apenas a justiça legal, mas também a contributiva e a distributiva e por isso, os planos de desenvolvimento e de trabalho das organizações internacionais deveriam levar em consideração o desejo de ver que se respeitam em todas as circunstâncias, os direitos fundamentais da pessoa humana, e da pessoa faminta em particular.
O interesse pela produção, a disponibilidade de alimentos e o acesso a eles, as mudanças climáticas, o comércio agrícola, devem certamente inspirar regras e medidas técnicas – continuou o Papa Francisco - mas a primeira preocupação deve ser a própria pessoa, aquelas que carecem de alimento cotidiano e que deixaram de pensar na vida, nas relações familiares e sociais e lutam apenas pela sobrevivência e, citando a intervenção de João Paulo II na FAO em 1992, alertou a comunidade internacional para o risco do “paradoxo da abundância”: existe comida para todos, mas nem todos podem comer, enquanto o desperdício, o descarte, o consumo excessivo e o uso de alimentos para outros fins estão sob nossos olhos, e este paradoxo infelizmente continua sendo atual. E falou igualmente da solidariedade como outro desafio que se deve enfrentar. O crescente individualismo e a fragmentação que caracterizam as nossas sociedades terminam por privar os mais frágeis de uma vida digna provocando revoltas contra as instituições - a solidariedade torna as pessoas capazes de ir ao encontro do próximo e fundar suas relações mútuas neste sentimento de fraternidade que vai além das diferenças e dos limites, e encoraja a procurarmos, juntos, o bem comum.
Cada mulher, homem, criança, idoso, deve poder contar em todas as partes com estas garantias e é dever de todo Estado, atento ao bem-estar de seus cidadãos, subscrevê-las sem reservas, e preocupar-se com a sua aplicação. A Igreja Católica procura oferecer também neste campo sua contribuição, através de uma atenção constante à vida dos pobres em todos os lugares do planeta, para identificar e assumir os critérios que o desenvolvimento de um sistema internacional equânime deve cumprir, critérios que, no plano ético, se baseiam em pilares como a verdade, a liberdade, a justiça e a solidariedade e, no campo jurídico, incluem a relação entre o direito à alimentação e o direito à vida e a uma existência digna, o direito a ser protegidos pela lei, nem sempre próxima à realidade de quem passa fome, e a obrigação moral de partilhar a riqueza económica do mundo.
E por último o Papa reiterou que nenhum sistema de discriminação, de facto ou de direito, vinculado à capacidade de acesso ao mercado dos alimentos, deve ser tomado como modelo das ações internacionais que se propõem a eliminar a fome e pediu ao Todo Poderoso para que abençoe todos aqueles que, com diferentes responsabilidades, se colocam ao serviço dos que passam fome e sabem atendê-los com gestos concretos de proximidade e para que a comunidade internacional saiba escutar as deliberações desta Conferência e considere expressão da comum consciência da humanidade: dar de comer aos famintos para salvar a vida no planeta. 20-11-2014
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